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quarta-feira, 29 de abril de 2009

[art] RADIOGRAFIA SOCIAL TUTELADA PELO DIREITO PENAL


O artigo que segue foi produzido como conclusão de um trabalho da faculdade, onde deveria ser feito um detalhista resumo da obra "Dos Delitos e Das Penas", de Cesare Beccaria.
Diante de tal fascinante e secular obra, foi inevitável avistar sua instantânea atualidade e tão logo me expressar a respeito de seus insights.


O Direito Penal surgiu com a incumbência de tutelar os bens jurídicos da sociedade, no entanto, como meio de coerção, podemos ver ao longo da história humana uma série de deficiências e desencontros entre a conduta delinquente e sua repreensão.

Esse direito de punir do Estado é concedido pela própria sociedade, onde parte do cerceamento da liberdade será em detrimento dos benefícios garantidos por aquele e por todo o agrupamento intersubjetivamente. Pois as relações entre os cidadão trazem inúmeras vantagens na vida cotidiana, assim, como forma de organizar essa estrutura social surgem as normas jurídicas que enquadradas num ordenamento complexo e intrincado, favorecem e mantém a harmonia entre os cidadãos.

No entanto, essa mantença harmoniosa muitas vezes é abalada através de conflitos ocasionados pelo ferimento de bens essenciais, são esses aqueles que merecem maior atenção por meio do Direito e o ramo Penal atribui sanções proporcionais a gravidade dessa ofensa.

Observando esse sistema, Beccaria, ao longo de sua maior obra Dos Delitos e Das Penas, critica e delineia soluções a crises que em sua época assolavam o sistema criminal, o esdrúxulo é perceber que muitas veias desse colapso ainda pulsam no organismo social contemporâneo. Baseando-se na Teoria do Contrato Social, do utilitarismo, da associação de ideias e do humanitarismo, vislumbra-se uma verdadeira reforma do sistema judiciário criminal, expurgando uma série de vícios sociais que se entrelaçam com o sistema de punição.

Houve uma transmutação da Filosofia à Legislação Penal, que repercutiu por toda a Europa e ainda hoje é referência a estimulação de entendimento ao Direito que hoje nos rege. Mostrou as deficiências da sociedade refletidas num sistema de repressão que tem como titular o Estado, mas que ao mesmo tempo versa de forma desigual nas diferentes esferas sociais. Beccaria vê nas normas a única forma de igualar as oportunidades e efeitos sociais, no entanto a lei deve estar sempre galgada na base moral dessa sociedade, pois de outro modo ela seja facilmente derrubada por qualquer intempérie, sendo a responsabilidade de sua criação exclusivamente do legislador, e só ela poderá atribuir a devida pena ao delito cometido.

E essa segurança transmitida pelas leis delimita claramente ao povo seus limites de ação, suas garantias e tão logo a forma de punição daquele que a transgrida. E somente assim seguindo-se a rigor as regras normativas que a sociedade poderá estar linearmente estabelecida. E assim, o Estado, esteja sempre atento a preservação da integridade física e moral de seu povo, inclusive preservando seus criminosos de uma deterioração progressiva.

As penas devem ter o limite exato e correspondente ao delito, e seu processo deve ser rápido e eficaz. Ela nunca será um castigo, mas uma reabilitação do sujeito infrator, desconstruindo aquela ideia delituosa, substituindo-a pela clareza de se estar em harmonia com o grupo social.

Beccaria explana com propriedade os mandos e desmandos daqueles que detém o poder em detrimento de benefícios para os seus, e consequentemente depreciando os pobres e os transgressores da lei. E isso fere a constituição social, porque trata o povo, verdadeiro senhorio do Estado, como escravo, e um Estado que assim proceda vive num colapso armado contra si mesmo.

Sendo o crime uma instituição difícil de se remediar, mostra-se mais sensato que seja realizado um movimento de prevenção que considere o povo como um ser individualizado, que requer cuidados e atenção ao longo de sua constituição como cidadão. O povo necessita de luz ao longo de suas ações, e isso só pode ser fornecido através da educação.

A educação dissuade o indivíduo da prática do mal, disciplina-o na constituição da sua honra e da sua vida, através de meios pacíficos e seguros. Esse recurso e seus efeitos, no entanto, são vislumbrados somente a longo prazo, porém opera de forma edificante na descendência social, através das virtudes e da moralidade.

E essa consciência se reflete de forma contundente no Direito Penal, doutrinando suas normas que outrora eram apenas uma forma resvalada de instituição da ordem social, numa verdadeira modulação daquilo que fere os bens sociais.

O crime é a última instância daquele que se rebela ao sistema, e não pode o próprio sistema responder a essa disfunção de forma repulsiva, vingando-se do indivíduo criminoso através de leis duras e cruéis. As penas devem ser medidas, limitadas e proporcionais a conduta criminosa, visando o restabelecimento do ser e reincorporação do indivíduo à sociedade comum. Por isso o Estado deve se valer do poder que detém visando o bem geral da nação e de seu povo, e só com leis certas, regulares e conscientes se pode alcançar o tal almejado bem-estar social.

Beccaria retrata as engrenagens de sua obra o que hoje vemos descrito em nosso Código Penal, cada dispositivo representa as ideias incursas pelo autor que há séculos atrás preconizou tais máximas, revolucionando o mundo jurídico. Hoje o que se necessita é a mesma revolução ideológica que outrora balançou os alicerces do ordenamento jurídico, estampando na lei a versão atualizada de uma sociedade mutável e transgressora cientificamente.

"Haverá justiça no mundo somente quando aqueles que não forem injustiçados se sentirem tão indignados quanto aqueles que o forem." Sólon}